Açoriano Oriental
Cursos para atrair jovens numa das escolas com mais abandono nunca abriram

Numa das escolas com maiores taxas de absentismo do país foram construídas modernas oficinas para atrair os alunos em risco de abandono, mas estão inativas por falta de financiamento, denunciou o diretor da escola açoriana.

Cursos para atrair jovens numa das escolas com mais abandono nunca abriram

Autor: Silvia Maia/Lusa

A Escola Básica Integrada de Rabo de Peixe, na ilha de São Miguel, é apontada como um dos “pontos negros” do insucesso e abandono escolar: “A taxa de abandono nos Açores é o dobro do continente e na escola de Rabo de Peixe é o dobro da média açoriana”, lamentou o presidente da Câmara Municipal de Ribeira Grande, Alexandre Gaudêncio, em entrevista à Lusa.

Quase metade dos alunos que estavam em risco de chumbar no final deste primeiro semestre era por abandono escolar, revelou o presidente do conselho executivo da Escola Básica Integrada de Rabo de Peixe, André Melo. O levantamento feito este ano mostrou que 47% destes estudantes do 2.º e do 3.º ciclos tinham muitas faltas de assiduidade.

Muitas crianças chegam ao 5.º ano e desinteressam-se pela escola. Não conseguem acompanhar as matérias e, gradualmente, começam a faltar.

“Percebemos logo quando não querem estar na sala de aula. Têm dificuldades, não conseguem estar com atenção e nós continuamos a persistir no ensino regular”, lamentou o diretor.

Para combater o insucesso, o Governo gastou cerca de 20 milhões de euros na requalificação da escola: o moderno edifício tem hoje um polidesportivo, piscinas, uma pista de atletismo com vista para o mar e oficinas de Carpintaria, Cerâmica, Mecanotecnia, Eletrotecnia e Culinária.

As oficinas estão prontas a usar, mas faltam equipamentos e materiais para trabalhar, denunciou o diretor.

A gigantesca sala de culinária, por exemplo, parece um cenário de um programa de televisão ou de uma telenovela. Tem uma enorme ilha com um fogão e exaustor, um lava-loiças e gigantescos armários com eletrodomésticos embutidos, mas não há nada dentro dos armários: Nem loiça, nem alimentos ou condimentos para cozinhar.

“Temos cinco oficinas, mas ainda não estão a funcionar por falta de financiamento. Não conseguimos comprar o material necessário para fazer aulas diferentes para os alunos, sendo que é isto que eles precisam”, desabafou André Melo.

Com estes projetos, os alunos poderiam interessar-se novamente pela escola, em vez de “estarem sentados o dia inteiro, com um caderno à frente e um professor a dar aulas”, disse.

No entanto, a única oficina que está a ser usada é a de carpintaria. Os materiais que os alunos usam são lixo apanhado na praia pelos professores, contou à Lusa Vladimir Ferreira, docente de Educação Tecnológica.

Tampas de garrafas, pedaços de plástico colorido, paus e pedaços de redes de pesca servem para fazer uma escultura que deverá ser afixada numa das paredes da escola, à semelhança de outras já em exposição.

Quando a Lusa visitou a escola, estavam apenas dois alunos na aula de Vladimir Ferreira. O professor disse que normalmente tem mais de uma dezena na sala, mas na altura das festas do concelho as faltas aumentam.

Na escola com cerca de dois mil alunos, conseguir que os alunos terminem o 9.º ano “é já uma grande vitória”, admitiu o diretor, explicando que depois de vários chumbos, há muitos alunos de 17 anos ainda a frequentar o 3.º ciclo. Quando atingem a maioridade, abandonam a escola.

Os Açores são a segunda região da Europa com a mais elevada taxa de abandono escolar precoce (21,7%), apenas ultrapassada por uma zona da Roménia, disse o sociólogo Fernando Diogo.

A situação do arquipélago tem vindo a melhorar desde o início do século, mas é preciso “continuar a trilhar esse percurso”, reconheceu a Secretária Regional de Educação, Sofia Ribeiro, em entrevista à Lusa.

“Nas últimas décadas têm sido inúmeros os trabalhos de acompanhamento de jovens”, disse Sofia Ribeiro, salientando que começaram agora a fazer “um acompanhamento de todos os alunos que no final do ano escolar não se matriculam”, mesmo quando já têm mais de 18 anos.

Pela primeira vez este ano, analisaram “as matrículas de todos os alunos, fazendo um filtro dos que não tendo completado o ensino secundário, tinham desaparecido do sistema”, revelou, explicando que a estes foram oferecidos “outros percursos de formação para assim combater o abandono precoce”.


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