Açoriano Oriental
25 Abril
Esta madrugada jornalistas combatem em palco boato da morte da profissão

 O Grupo de Teatro Jornalistas do Norte revive hoje a madrugada de Abril, a partir da 01:00, quando tem início a peça "A Noite", de José Saramago, numa encenação que também é combate ao boato da morte do jornalismo.

Esta madrugada jornalistas combatem em palco boato da morte da profissão

Autor: Lusa /AO Online

A estreia acontece no Teatro Constantino Nery, em Matosinhos, no tempo real em que Saramago coloca a ação.

Escrita em 1979, a obra retrata aquela que foi “a mais bela madrugada” vivida na redação de um jornal diário de Lisboa. Está tudo a postos, mas na abordagem do Grupo de Teatro Jornalistas do Norte, os atores são interrompidos pelo boato da morte do jornalismo no presente. E então tudo recomeça e à ação de 1974 junta-se o que está em causa nos dias de hoje e a demonstração de que o jornalismo vive.

No palco, está lá tudo, como no tempo de "A Noite" de Saramago: as máquinas de escrever, o velho transístor, o tabaco espalhado, muitas folhas, o telex, a 'menina' da agenda, que anda enrolada com o sabujo do chefe de redação, a jornalista idealista, Torres - o revolucionário, as saias abaixo do joelho, os cabelos presos, os pulôveres aos quadrados, o colete reluzente do senhor diretor e, claro, o senhor engenheiro, 'o homem do dinheiro'.

A edição do dia 25 está fechada, a primeira página é obra do diretor, leal à ditadura, o ambiente é de alguma crispação. Há ali jornalistas que ousam pensar. A revolução entra pela redação trazida pelos “ilustres tipógrafos”, vozes que o 'senhor diretor' tenta calar com a desculpa de que “é preciso salvar o jornal”.

Mas pelo palco circula Sara Mago, que fala para o público, “uma cronista de um outro movimento” paralelo, que emerge, do jornalismo hoje.

“Há um grupo, que é fictício, de jornalistas, que se junta para montar 'A Noite', mas entretanto, no sentido alegórico, corre que o jornalismo está para morrer e, durante a peça, 'a coisa dá para o torto' e aparece o boato de que o jornalismo morreu”, explicou à Lusa Simão Freitas, que juntamente com João Gaspar criou a dramaturgia desta nova "Noite".

“É também exercício de autocrítica, sobre que jornalismo nos estão a obrigar a fazer. Há um grito de alerta para a perda de controlo editorial, para as administrações, para os baixos salários, a precariedade. Estamos num período em que o tempo é tão frenético e as condições laborais tão deterioradas que começamos a trabalhar vergados. Nós não queremos trabalhar mais vergados”, salientou o jornalista.

A própria “criação do grupo de teatro” faz parte da dramaturgia: “O grupo é fictício, há jornalistas - ou melhor - atores que fazem mais do que um papel, mas não é por falta de gente, é porque nós estamos cada vez mais proletários enquanto classe, temos de fazer tudo, tornam-nos autómatos. A ideia do jornalismo como uma profissão intelectual, liberal perdeu-se, porque temos é de produzir, produzir e produzir."

Esta "Noite", no entanto, é também um grito de liberdade, de esperança e “tem muito do 25 de Abril” até porque, salientou Simão Freitas, “só se consegue fazer uma peça com este radicalismo, porque aquela noite trouxe a liberdade”.

"E também só a conseguimos fazer da forma que fizemos, com o nível de crítica, análise, de radicalismo nos termos que fizemos, porque acreditamos que o jornalismo não está morto. Não está. Nós não desistimos, ninguém quer baixar os braços e ir para casa dedicar-se a outra coisa qualquer, nem queremos continuar neste jornalismo que criticamos”, concluiu.

"A Noite", pelo Grupo de Teatro Jornalistas do Norte, sobe novamente ao palco do Constantino Nery no sábado, dia 27, às 21:30, e no domingo, dia 28, às 16:00, estando previstas ainda apresentações em Vila Real, Ourém, Aveiro, Coimbra, Santarém e Leiria.

Em palco, fazem "A Noite" Aline Flor, André Borges Vieira, Camilo Soldado, Catarina Ferreira, Dora Mota, Francisco D. Ferreira, João Gaspar, João Nápoles, Joana Ascensão, Jorge Eusébio, Luísa Marinho, Maria João Monteiro, Pedro Emanuel Santos e Simão Freitas. A encenação é de Jorge Louraço Figueira e Leonor Wellenkamp Carretas.


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